Jackson Cionek
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Cheiros agradáveis, respiração e acoplamento cérebro–corpo

Cheiros agradáveis, respiração e acoplamento cérebro–corpo

(Consciência em Primeira Pessoa, Neurociência Decolonial e o caminho do Taá pelo nariz)


1. Antes de entender o mundo, eu cheiro

Eu fecho os olhos e lembro de um cheiro que me acalma.
Pode ser café passado na hora, mato molhado depois da chuva, a roupa de alguém que eu amo, o cheiro da Mata Atlântica ao amanhecer.

Quando esse cheiro vem, eu não penso: eu sinto.
Minha respiração muda sozinha:

  • ela fica mais lenta,

  • mais profunda,

  • meu peito parece ganhar espaço,

  • o ritmo do coração baixa meio passo.

Se alguém mede meu corpo nesse momento, encontra números;
mas, se eu me meço por dentro, encontro uma coisa muito simples:

“eu estou mais aqui”.

É isso que eu chamo, com nossos conceitos, de um momento de Consciência em Primeira Pessoa: não como teoria, mas como experiência. Eu não estou estudando o corpo; eu sou o corpo que respira.

E então eu encontro o trabalho de Valentin Ghibaudo, Matthias Turrel, Jules Granget, Maëlys Souilhol, Samuel Garcia, Jane Plailly e Nathalie Buonviso, publicado em 2025 na Scientific Reports, com o título:

“Pleasant odors specifically promote a soothing autonomic response and brain–body coupling through respiratory modulation”

E eu sinto que ele está descrevendo justamente isso:
como um cheiro agradável reorganiza respiração, coração e atividade cerebral – e como isso pode ser visto como um Taá moderno, medido em EEG.


O Sentir e Saber Taá

Para mim, Taá é quando a informação não fica só na cabeça:
ela entra pelo corpo, mexe na respiração, no coração, na pele – e, depois disso, passa a ser um saber vivido.

Neste estudo, os autores fazem exatamente a pergunta que eu gostaria que todo estudante Brain Bee se fizesse no seu próprio corpo:

“O que um cheiro agradável faz com a minha respiração, com o meu coração e com o meu cérebro – tudo ao mesmo tempo?”

O Taá aqui é triplo:

  1. Eu sinto o cheiro.

  2. Meu corpo muda o jeito de respirar.

  3. O cérebro entra em acoplamento com essa nova respiração.

A partir daí, eu posso falar em Neurociência Decolonial sem ser apenas político:
eu estou dizendo que o caminho do saber passa pelo nariz, pelo peito, pelo ritmo respiratório – e não só pela leitura de PDFs.


2. O que Ghibaudo e colegas fizeram (e encontraram)

Os autores pegaram um grupo de participantes e fizeram algo muito direto: 

  • Cada pessoa escolheu um odor pessoalmente agradável.

  • Também foi escolhida uma música pessoalmente agradável.

  • Em diferentes blocos, a pessoa ficava exposta por cerca de 10 minutos:

    • ao cheiro agradável,

    • à música agradável,

    • e a condições controle.

Enquanto isso, eles registravam:

  • Respiração (frequência e volume inspiratório),

  • Atividade cardíaca (frequência cardíaca e variabilidade da frequência cardíaca – HRV),

  • Sensação subjetiva de relaxamento/arousal,

  • EEG travado à respiração – isto é, oscilações cerebrais alinhadas ao ritmo da respiração.

Os resultados centrais:

  • Só os odores agradáveis:

    • diminuíram a frequência respiratória,

    • aumentaram o volume inspiratório,

    • reduziram a frequência cardíaca,

    • aumentaram a variabilidade da frequência cardíaca (HRV) – o que é sinal de maior tônus parassimpático, um corpo mais “em descanso”.

  • No EEG, só os odores aumentaram a atividade cerebral relacionada à respiração em uma rede temporo–parieto–central – um acoplamento mais forte entre cérebro e ritmo respiratório.

  • A música, curiosamente, aumentou a excitação subjetiva, mas não gerou o mesmo acoplamento autonômico e cérebro–respiração.

Os autores propõem a ideia de uma resposta “olfactomotora”:
o cheiro agradável muda a respiração, e essa respiração mudada dirige ritmos cerebrais para um estado de maior relaxamento e interocepção.


3. Como eu leio isso com nossos conceitos

Quando eu trago esse artigo para nossos conceitos, várias coisas se encaixam:

a) Mente Damasiana e Corpo Território

Já dizíamos que a mente nasce do corpo em permanente leitura interna.
Aqui, a rota é claríssima:

Cheiro → Respiração → Coração → EEG → Estado de consciência.

Esse caminho mostra que o Corpo Território não é metáfora:

  • o ar que entra pelo nariz,

  • o caminho até o pulmão,

  • o impacto no coração,

  • a forma como isso se espalha para redes cerebrais,

é literalmente um território fisiológico de onde emerge a experiência de “estar relaxado”, “estar presente”, “estar em Taá”.

b) Zona 2 – Fruição como estado fisiológico

A Zona 2, para nós, é o estado de fruição:

  • nem apagado,

  • nem hiperalerta ideológico,

  • mas em equilíbrio criativo.

O que Ghibaudo e colegas mostram é que cheiros agradáveis são uma porta de entrada fisiológica para algo muito parecido com Zona 2:

  • respiração mais lenta e profunda,

  • HRV mais alta,

  • acoplamento cérebro–corpo mais forte,

  • sensação de relaxamento maior (mesmo que não exploda nas escalas subjetivas).

Para mim, isso é Neurociência Decolonial aplicada:
reconhecer que caminhos ancestrais de uso do cheiro (ervas, incensos, resinas, mata, fogueiras) não eram “crendice”, mas tecnologia somato-espiritual baseada em mecanismos que hoje o EEG confirma.

c) Eus Tensionais e odores

O cheiro não só acalma; ele reorganiza o tipo de eu tensional que está ativo:

  • em estado de alerta ansioso, eu tenho um eu tensional de sobrevivência, com respiração rápida e superficial;

  • diante de um odor agradável, eu deslizo para um eu tensional de fruição, com mais espaço respiratório e mais flexibilidade autonômica.

O estudo ajuda a objetivar isso: o mesmo indivíduo, em minutos, muda completamente o metabolismo existencial sob efeito de um odor.


4. Onde a ciência nos corrige e nos afina

Antes desse estudo, eu poderia cair na tentação de dizer:
“música e cheiro são igualmente bons para induzir fruição”.

Aqui, a ciência com evidência me faz ajustar:

  • música, pelo menos nesse contexto, aumenta mais a excitação subjetiva do que a acoplagem fisiológica profunda;

  • cheiros agradáveis, personalizados, são muito mais potentes em mexer no acoplamento respiração–coração–EEG.

Isso me obriga a:

  1. Dar mais peso à olfação nos nossos modelos de Zona 2 e fruição.

  2. Ver o nariz não só como porta de memória afetiva, mas como gatilho regulatório primário.

  3. Reconhecer que um certo “fetiche da música” (como se ela fosse sempre a melhor via) pode ser europeizado:

    • povos originários usam intensamente cheiros (fumaça, plantas, resinas) para organizar estados de consciência.

A ciência, aqui, confirma a sabedoria ameríndia – mas também coloca limites: nem todo cheiro, nem toda aromaterapia, nem todo ambiente perfumado é automaticamente bom; depende da pessoa, da história, do contexto, do tipo de odor.


5. Sementes normativas para cidades e políticas LATAM

Se eu penso isso como Neurociência Decolonial aplicada, vários pontos normativos aparecem:

  1. Políticas de “paisagem olfativa” urbana

    • Regulamentar níveis de poluição olfativa (cheiros agressivos constantes em áreas pobres, por exemplo).

    • Incentivar projetos que devolvam cheiros de natureza a praças, escolas e hospitais – não só “perfumes industriais”, mas vegetação viva.

  2. Arquitetura hospitalar e de cuidado

    • Hospitais públicos poderiam incluir jardins olfativos, espaços de respiro com cheiros agradáveis naturais, em vez de apenas cheiro de desinfetante.

    • Protocolos de cuidado que usem odor personalizado (quando possível) como coadjuvante na regulação autonômica de pacientes.

  3. Regulação de uso manipulado de odores em consumo

    • Shoppings, cassinos, casas de jogo, grandes redes de varejo já usam cheiros para induzir permanência e consumo.

    • Este tipo de evidência dá base para discutir limites éticos: até que ponto empresas podem modular respiração, HRV e acoplamento cérebro–corpo de cidadãos para vender mais?

  4. Educação para Consciência em Primeira Pessoa

    • Inserir em currículos escolares exercícios simples de:

      • perceber o cheiro do ambiente,

      • notar como ele muda a respiração,

      • discutir isso em sala como forma de Consciência em Primeira Pessoa.

    • Trazer a linguagem Brain Bee: “O que seu cérebro sente quando você cheira a escola?”

Essas são micro-medidas que podem ser transformadas em leis municipais, diretrizes de arquitetura e até princípios constitucionais ligados ao direito a ambientes que não sequestram a fisiologia do cidadão.


6. Palavras-chave para buscar o artigo

Para encontrar a publicação original, sem links, basta buscar por:

“Ghibaudo 2025 Pleasant odors specifically promote a soothing autonomic response and brain–body coupling through respiratory modulation Scientific Reports s41598-025-20422-x”


Para mim, este Blog consolida algo muito bonito:
a respiração entra como ponte entre o Taá ancestral e o EEG moderno.

Se quisermos uma América Latina que se pense a partir da própria carne, dos próprios cheiros, do próprio Corpo Território, este é um dos artigos que nos autoriza a dizer, com serenidade científica:

Sentir não é fraqueza. Sentir é método.




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Jackson Cionek

New perspectives in translational control: from neurodegenerative diseases to glioblastoma | Brain States