Reprodutibilidade em fNIRS: quando posso confiar no que o cérebro está mostrando?
Reprodutibilidade em fNIRS: quando posso confiar no que o cérebro está mostrando?
(Consciência em Primeira Pessoa • Neurociência Decolonial • Brain Bee • O Sentir e Saber Taá)
O Sentir e Saber Taá
Eu respiro fundo diante de um dado fisiológico.
Olho para um gráfico de hemodinâmica pré-frontal, aqueles pulsos lentos de O₂-Hb e HHb subindo e descendo como pequenas marés.
Às vezes, eu sinto que confio plenamente na curva; outras vezes, sinto que há algo estranho — ruído, instabilidade, uma variação que não bate com minha intuição corporal.
Nesse instante de dúvida, algo fica muito claro:
Se eu não confio na medida, eu não confio na interpretação.
E se eu não confio na interpretação, eu não confio na própria ciência.
A ciência começa sempre no Taá da percepção: o sentir que algo faz sentido — ou que algo não fecha.
E é exatamente isso que o estudo de Brigitta Pósa, Quentin Gisiger, Justine Clément, Emmanuel Sallard e colaboradores enfrenta diretamente no artigo publicado em NeuroImage (2025):
“Variability and reproducibility of fNIRS measurements across sessions and participants”
(busca: NeuroImage 2025 reproducibility fNIRS variability cross-session)
Este é um dos temas centrais da neurociência contemporânea:
Quando posso acreditar que aquilo que vejo no fNIRS é real e não um artefato, ruído fisiológico ou variação individual?
1. A pergunta científica: o quanto fNIRS realmente se repete?
Imagine que eu meço sua atividade pré-frontal hoje, depois amanhã, depois semana que vem.
A pergunta é:
O padrão hemodinâmico volta igual?
Ou muda tanto que não sei o que é efeito do cérebro e o que é aleatoriedade?
Reprodutibilidade importa porque:
se a resposta não é consistente,
qualquer conclusão científica, clínica ou educacional perde força.
O estudo compara sessões repetidas, participantes diferentes, tarefas distintas e diversas configurações de hardware — exatamente o que o campo real enfrenta fora do laboratório perfeito.
2. Como foi feita a análise (GLM, ICA/PCA, short-channels, HRF)
Para entender reprodutibilidade, os autores aplicaram todos os componentes modernos da pipeline fNIRS:
1. Modelagem da Resposta Hemodinâmica (GLM)
Ajuste da resposta com GLM (General Linear Model);
Estimação de betas individuais para cada condição experimental;
Comparação de parâmetros hemodinâmicos (amplitude, latência, forma).
2. Filtragem de ruídos sistêmicos
Remoção de batimento cardíaco, respiração e drenagem venosa superficial;
Uso de short-channels para separar sinal extracortical de sinal cortical, aumentando precisão.
3. Métodos de decomposição (ICA/PCA)
Aplicação de ICA para remover componentes claramente não neuronais;
Uso de PCA para identificar padrões globais de variabilidade entre sessões.
4. Estimativa da HRF individual
Modelagem da HRF (Hemodynamic Response Function) personalizada para cada participante,
reconhecendo que cada cérebro tem seu ritmo hemodinâmico particular.
5. Comparação estatística inter-sujeitos e intra-sujeito
Correlações entre sessões,
Mapas de estabilidade espacial,
Análises multivariadas para verificar consistência dos padrões.
É uma das tentativas mais completas de responder:
fNIRS é estável o bastante para decisões científicas robustas?
3. O que foi encontrado: estabilidade existe, mas depende de cuidado
Os resultados mostram:
Há variabilidade significativa entre sessões — principalmente em amplitude absoluta das curvas.
Entretanto, padrões relativos (como qual área ativa mais que outra, ou a forma da curva HRF) tendem a ser bem mais estáveis, especialmente quando:
short-channels são usados,
GLM é bem especificado,
artefatos sistêmicos são reduzidos,
e a tarefa é bem controlada.
Em outras palavras:
O fNIRS não é ruidoso demais; o mundo biológico é que é variado.
O método pode ser robusto, mas exige rigor.
Isso é extremamente relevante para qualquer área que pretenda usar fNIRS em:
educação,
avaliação cognitiva,
estudos de fruição,
investigações de Zona 2,
ou políticas públicas baseadas em métricas de atenção.
4. Nossos conceitos à luz dos resultados
a) A Mente Damasiana e a variabilidade como vida
A variabilidade entre sessões não é um problema conceitual.
Ela fala algo profundo:
o corpo nunca chega igual no mundo.
a interocepção muda,
a propriocepção muda,
a atenção muda.
O fNIRS está capturando exatamente essa plasticidade contínua do corpo que sente.
b) Quorum Sensing Humano e variabilidade hemodinâmica
Se humanos se regulam mutuamente, então:
sinais hemodinâmicos mudam conforme contexto social,
conforme presença do outro,
conforme expectativa, ambiente, temperatura, ruído.
A reprodutibilidade não é apenas técnica — é ecológica.
c) Zona 2 depende de estabilidade fisiológica
Para acessar a Zona 2 (fruição e criatividade), é necessário:
estabilidade autonômica,
respiração regulada,
hemodinâmica suave.
Se esses parâmetros variam, então a própria Zona 2 oscila.
Isso aparece no fNIRS como variabilidade inter-sessão.
d) DANA como inteligência fisiológica
Os autores mostram que cada pessoa tem um “ritmo hemodinâmico próprio”.
Isso se encaixa perfeitamente com DANA:
O DNA não produz respostas idênticas em todos — ele produz sistemas adaptativos.
5. Onde a ciência ajusta nosso pensamento
Antes poderíamos imaginar que:
se o método é bom, deveria dar sempre igual.
Mas o estudo demonstra:
a natureza da hemodinâmica não é mecânica,
é modulada por fatores ambientais, emocionais e fisiológicos,
e isso não é erro — é o funcionamento natural do corpo.
Isso exige que nossas interpretações sejam:
contextualizadas,
ecológicas,
sensíveis à variabilidade natural do ser humano.
Reprodutibilidade não é rigidez;
é coerência dentro da complexidade.
6. Implicações normativas para educação, saúde e políticas LATAM
1. Programas educacionais usando neurotecnologia
Avaliações baseadas em fNIRS precisam de:
short-channels,
GLM bem modelado,
tarefas padronizadas,
múltiplas sessões para garantir confiabilidade.
2. Protocolos clínicos mais rigorosos
Tratamentos que monitoram funções executivas ou atenção com fNIRS precisam levar em conta:
variabilidade intra-sujeito,
efeitos respiratórios,
fadiga e hidratação.
3. Políticas públicas de neurodireitos
Variabilidade não deve ser interpretada como “erro humano” ou “ineficiência”.
Ela é o estado natural do corpo.
4. Desenho urbano neuroecológico
Ambientes que reduzem variabilidade fisiológica desnecessária — ruído, calor, estresse — ajudam a tornar medidas cognitivas mais estáveis e confiáveis.
7. Palavras-chave para busca científica
“fNIRS reproducibility variability cross-session short-channels GLM HRF NeuroImage 2025 Pósa Gisiger Clément Sallard”