Jackson Cionek
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Processamento emocional em crianças com comportamento opositor Jiwasa rachado entre mãe e filho e o que o fNIRS revela do corpo que luta com as emoções

Processamento emocional em crianças com comportamento opositor

Jiwasa rachado entre mãe e filho e o que o fNIRS revela do corpo que luta com as emoções

 (Consciência em Primeira Pessoa • Neurociência Decolonial • Brain Bee • O Sentir e Saber Taá)


O Sentir e Saber Taá — abrindo a fresta de descolonização

Eu vejo uma criança dizendo “não” o tempo todo.
Ela fecha a cara, cruza os braços, provoca, desafia.
Sinto, no meu corpo, a mistura de cansaço, raiva, culpa e amor.

Uma parte de mim pensa:

“ele é teimoso”,
“ela é desobediente”,
“esse menino vai dar problema”.

Meu Taá sente primeiro: sente o desgaste, o conflito, o embate diário.
Mas eu sei que o Taá também erra:
assim como sinto que o Sol gira em torno da Terra,
assim como sinto que a lua é maior no horizonte,
eu posso sentir que essa criança “é ruim” —
quando, na verdade, algo muito mais profundo está acontecendo no corpo dela.

Também percebo que até as palavras que uso para falar dessa criança foram colonizadas.
O idioma com que descrevo o “filho difícil” foi moldado para reduzir:
reduzir o corpo a máquina defeituosa,
a mente a déficit,
a espiritualidade a superstição,
a política a obediência, consumo e produtividade.

É assim que muitos modelos científicos e clínicos ainda olham para o comportamento opositor:
como falha, desvio, problema a ser corrigido, e não como um Jiwasa rachado
um pronome singular inclusivo entre mãe e filho que perdeu sua continuidade de pertencimento.

Quando eu sinto meu corpo antes de pensar — quando Taá se manifesta —
eu percebo que não existe separação entre Neurociência, Política e Espiritualidade (Utupe, Xapiri, memória viva).
O que coloniza não é só a história:
é a palavra que chama de “transtorno” aquilo que talvez seja também um grito de contexto, de violência, de não-pertencimento.
Cada descoberta científica, quando lida com coragem, é uma fresta de liberdade que rompe a Zona 3  e devolve o corpo — inclusive o corpo da criança rotulada como “opositora” — ao que sempre foi:  território vivo de mundos possíveis.

É nesse espaço que leio o estudo de Peizhong Wang, Ting He, Wenrui Zhang, Peilian Chi e Xiuyun Lin, publicado em 2025 em Social Cognitive and Affective Neuroscience:

Emotion process deficits in children with ODD and their associations with different dimensions of ODD symptoms: A fNIRS study.”


A pergunta científica: o que acontece com a emoção no cérebro da criança “opositora”?

Oppositional Defiant Disorder (ODD) é descrito como um padrão persistente de:

  • humor irritável,

  • comportamento desafiador,

  • discussões e ressentimento.

Mas os autores perguntam algo mais fino:

Quais processos emocionais, no cérebro, estão alterados nessas crianças?
E como essas alterações se conectam às duas dimensões centrais do ODD: sintomas afetivos e sintomas comportamentais?

Para isso, eles usam fNIRS para olhar diretamente a hemodinâmica pré-frontal enquanto as crianças:

  • reconhecem emoções em rostos (ERC – emotion recognition),

  • regulam suas emoções diante de estímulos emocionais (ERG – emotion regulation).


Como o estudo foi feito: fNIRS, GLM, HRF e caminho duplo da emoção

Foram avaliadas 72 crianças:

  • 35 com ODD,

  • 37 com desenvolvimento típico (grupo controle).

Todas realizaram tarefas de:

  • reconhecimento emocional (ERC) – identificar expressões emocionais,

  • regulação emocional (ERG) – modular a reação a estímulos emocionais.

Enquanto isso, a atividade do córtex pré-frontal era medida por fNIRS, com foco em regiões como:

  • SFGmed (giro frontal superior medial),

  • SFGdor (giro frontal superior dorsolateral),

  • MFG (giro frontal médio).

Pipeline de análise (modo Brain Bee)

  • Os sinais de concentração de O₂-Hb e HHb foram ajustados com GLM (General Linear Model),
    usando uma HRF (Hemodynamic Response Function) adequada ao tempo da tarefa.

  • Foram considerados short-channels para capturar ruído superficial (pele, vasos extracorticais),  aumentando a chance de que o que sobra seja, de fato, atividade cortical.

  • Técnicas de ICA/PCA ajudam a separar componentes fisiológicos (respiração, batimento, movimento)  dos componentes relacionados à tarefa.

  • Depois, os autores empregam análises de caminho (path analysis),
    uma forma de análise multivariada que testa como déficits neurais em certas áreas
    se conectam a diferentes dimensões de sintomas afetivos e comportamentais.


O que foi encontrado: o cérebro parece “normal” no comportamento, mas silencioso na emoção

Algo muito forte aparece nos resultados:

  • As crianças sem ODD mostram ativações robustas no pré-frontal:

    • direito MFG,

    • direito SFGdor,

    • bilateral SFGmed durante o reconhecimento de emoções (ERC),

    • e direito SFGdor durante regulação emocional (ERG).

  • As crianças com ODD não mostram esses padrões de ativação clara,
    apesar de o comportamento nas tarefas (acertos, erros) não ser tão diferente.

Ou seja:

Do lado de fora, a performance pode parecer “ok”;
do lado de dentro, o pré-frontal não está engajando da mesma forma.

Quando os autores fazem a path analysis, encontram um “caminho duplo”:

  • Déficits neurais na SFGmed durante reconhecimento emocional (ERC) preveem mais sintomas afetivos (irritabilidade, ressentimento).

  • Déficits neurais na SFGdor durante regulação emocional (ERG) preveem mais sintomas comportamentais (discussões, desafio aberto).

Eles propõem um modelo de duplo processamento da emoção no ODD:

  1. Um eixo mais afetivo – ligado a como a criança reconhece e sente a emoção.

  2. Um eixo mais comportamental – ligado a como ela regula (ou não) essa emoção.


Lendo com nossos conceitos: Jiwasa rachado, Jiwasa a reconstruir

Quando olho para esses dados com nossos conceitos, vejo vários níveis:

Mente Damasiana e Eus Tensionais

A Mente Damasiana diz que consciência vem do encontro entre:

  • interocepção (sensações internas),

  • propriocepção (posição e movimento do corpo).

No ODD, os dados sugerem que:

  • a criança vê o rosto,

  • mas o pré-frontal não organiza direito a ponte entre o que ela sente e o que ela faz;

  • o Eu Tensonal que aparece é um eu de defesa, luta, oposição —
    um modo de existir que protege da dor emocional, mas rompe o fluxo com o outro.

Quorum Sensing Humano e Jiwasa

Em vez de pensar “criança-problema”, penso em Jiwasa:
um pronome singular inclusivo, que é ao mesmo tempo “eu” e “nós” entre mãe e filho.

Num Jiwasa saudável:

  • o corpo da mãe regula o da criança,

  • o tom de voz, o olhar, o toque criam um campo de co-regulação,

  • o QSH (Quorum Sensing Humano) está íntegro.

Nos quadros de ODD, muitas vezes:

  • o Jiwasa está rachado,

  • a criança e o cuidador não conseguem mais entrar na mesma frequência,

  • gestos de cuidado são percebidos como ameaça,

  • limites viram guerra.

Mesmo que esse estudo específico não meça a díade diretamente,
ele mostra como por dentro o cérebro da criança já está organizado para a luta,
não para a co-regulação.

DANA e destino não fixo

A DANA — inteligência do DNA — não escreveu no código “criança desafiadora para sempre”.
Ela escreveu: sistema plástico, que pode:

  • aprender regulações mais finas,

  • encontrar novos caminhos para o pré-frontal se engajar,

  • reconstruir o Jiwasa com apoio, tempo e contexto.


Arte latino-americana como espelho desse Jiwasa rompido

Quando penso em crianças com comportamento opositor em contextos latino-americanos,
me vem à mente Eduardo Galeano em “Los nadies”
“os ninguéns” que não contam, que não medem, que não aparecem nas estatísticas,
e que só são notados quando “dão trabalho”.

A criança com ODD muitas vezes é um “nadie” emocional:

  • ninguém pergunta o que o corpo dela está tentando dizer,

  • ninguém mede o custo fisiológico de viver em conflito permanente,

  • ninguém vê o pré-frontal silencioso tentando não desmoronar.

Ler esse artigo com Galeano ao lado é lembrar que:

não existe ODD fora da história, da pobreza, da violência, do racismo,
nem fora das expectativas coloniais de obediência e produtividade.


Avatar e recorte BrainLatam2026

Ao nos referenciarmos no avatar Olmeca,
consigo ver esse estudo como um recorte que mostra
como a cultura, a família e a escola intermediam o cérebro da criança:

  • o rosto não é só um estímulo neutro;

  • é o rosto da mãe cansada, do professor irritado,

  • da figura de autoridade que carrega séculos de colonização nas palavras que usa.

Olmeca me lembra que não é só pré-frontal que está em jogo,
mas também o modo como a cultura define o que é “criança boa” e “criança difícil”
dentro de uma história latino-americana em que quem resiste sempre foi punido.


Onde a ciência ajusta nossas ideias

Esse artigo corrige várias simplificações:

  • Mostra que não basta olhar para o comportamento:
    a criança pode “acertar” na tarefa, e mesmo assim o cérebro não engajar como o de uma criança típica.

  • Mostra que afeto e comportamento são eixos diferentes:
    sintomas afetivos se conectam mais a déficits em reconhecimento emocional,
    e sintomas comportamentais, a déficits em regulação.

  • Sugere que falar apenas em “falta de limites” é curto demais:
    há um padrão neurohemodinâmico específico, um modo de corpo-cérebro operando no mundo.

Para nós, isso confirma que:

  • Zona 3 não é só ideologia política;
    pode ser também um estado em que a criança está presa em padrões de defesa,
    com pouca margem para Zona 2 de fruição, jogo e criação.

  • A saída não é só punir ou medicar,
    mas criar contextos que reconstruam o Jiwasa,
    com paciência, arte, cultura e ciência com evidência.


Implicações para educação, clínica e políticas LATAM

  1. Escola

    • Formação de professores para entender ODD como questão de processamento emocional,  não apenas de disciplina.

    • Espaços de regulação emocional na escola (música, movimento, respiração, arte).

  2. Clínica

    • Uso de fNIRS e outras técnicas não como rótulo,  mas como forma de mostrar à família que há um cérebro em esforço — não um caráter “estragado”.

  3. Políticas públicas

    • Programas de apoio à parentalidade em territórios vulneráveis,
      pensando o Jiwasa mãe–filho como unidade de cuidado.

    • Políticas que reconheçam que externalização de raiva na infância muitas vezes é  resposta a contextos coloniais de humilhação, racismo e miséria.


Palavras-chave para busca científica

“Wang 2025 Emotion process deficits in children with ODD dimensions fNIRS prefrontal ERC ERG SFGmed SFGdor Social Cognitive and Affective Neuroscience”




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Jackson Cionek

New perspectives in translational control: from neurodegenerative diseases to glioblastoma | Brain States