Você sabe o que acontece no cérebro durante o envelhecimento? Como a neurociência explica?
Vamos começar apresentando nosso “carro chefe”, o cérebro. O cérebro humano contém mais de 10 bilhões de neurônios e ele é capaz de realizar mais de 10 trilhões de sinapses, formando redes neurais de complexidade inimaginável. A evolução nos forneceu um cérebro no qual cada neurônio pode servir a múltiplas funções, dependendo da especificidade da tarefa e a necessidade em cada momento, ou seja, os neurônios estão sujeitos à modulação contextual de sua função.
O cérebro, como as demais estruturas do corpo humano, passa pelo processo do envelhecimento. O envelhecimento pode ser entendido como um processo dinâmico e progressivo, caracterizado tanto por alterações morfológicas, funcionais e bioquímicas. Em consequência disso, algumas limitações de ordem cognitiva podem aparecer durante o envelhecimento, porém podemos atenuar esse declínio através de alguns processos neuroprotetivos (veremos no decorrer das “4” matérias).
Mas o que acontece com o nosso sistema nervoso (SN) durante o envelhecimento? No início da vida, o SN ainda não está completamente formado e, com base nos estímulos ambientais, começamos a moldar nossas principais conexões sinápticas. Bebês e crianças tem um sistema nervoso tão dinâmico e capaz de uma quantidade tão grande de conexões que isso os torna extremamente aptos a aprendizagem das mais diversas atividades. À medida que o cérebro amadurece, o número de filopódios dendríticos diminui (as chamadas - “podas neuronais”) e o número de espinhas dendríticas estáveis aumenta, reforçando as conexões que já possuímos.
As espinhas dendríticas, que são pequenas extensões da superfície dendrítica, fornecem um substrato anatômico para armazenamento de memória e transmissão sináptica, e também podem aumentar o número de contatos possíveis entre os neurônios. As espinhas que já alcançaram a maturidade permanecem plásticas no cérebro adulto e, também, podem sofrer remodelação estrutural, como aumento, redução ou eliminação completa, em resposta a vários estímulos (KASAI et al., 2010). Esta plasticidade estrutural das espinhas dendríticas mostrou-se correlacionada com a plasticidade funcional no nível da sinapse individual e a indução de potenciação de longo prazo (LTP) ou depressão de longo prazo (LTD), que pode aumentar ou diminuir a força da sinapse, mostrou desencadear mudanças na morfologia da coluna dendrítica. O glutamato, apresenta-se como o neurotransmissor excitatório mais comum, cerca de 80% no cérebro e, é liberado nos terminais pré-sinápticos durante a transmissão sináptica para ativar receptores específicos de glutamato localizados no local pós-sináptico (ex. receptores - NMDA e AMPA).
Portanto, a atividade sináptica desempenha um papel de extrema importância, seja na regulação da formação, maturação e plasticidade da coluna dendrítica por mecanismos moleculares envolvidos na ativação de receptores de glutamato pós-sinápticos, bem como outros receptores de superfície celular que não estão diretamente envolvidos na transmissão sináptica, mas podem modular a atividade sináptica e desencadear mudanças no número e morfologia da coluna dendrítica. Ao longo da vida, além dos estímulos fisiológicos, os estímulos patológicos também podem desencadear a ativação desses receptores de superfície e podem levar à formação, maturação ou remodelação das espinhas pós-sinápticas.
No envelhecimento, o que acontece é uma reorganização sináptica associada ao declínio de importantes neurotransmissores e a área mais afetada por essa reorganização é o córtex pré-frontal, podendo levar a um declínio das atividades cognitivas. A doença de Alzheimer (DA) resulta em perda da função neuronal e dano sináptico, com subsequente comprometimento da memória, da coordenação motora e do raciocínio, além da perda da capacidade cognitiva e demência. Entre as causas mais evidentes da doença estão a ocorrência e deposição extracelular de placas - amilóides e a formação errática de neurofibrilas intracelulares contendo um formato anormal, fosforilada, da proteína Tau, associada a microtúbulos. Esta fosforilação anormal altera as funções normalmente exercidas pela proteína Tau, como a participação na montagem e estabilização dos microtúbulos.
Portanto, entender o ponto de vista estrutural, funcional e processual que garante a manutenção e a formação dessas espinhas dendríticas, bem como a formação das redes perineurais se faz necessário. Acompanhe a segunda matéria para a obtenção detalhada.
Referências:
KANDEL, Eric et al. Princípios de neurociências-5. AMGH Editora, 2014.
KASAI, Haruo et al. Learning rules and persistence of dendritic spines. European Journal of Neuroscience, v. 32, n. 2, p. 241-249, 2010.
Texto: Profa. Luciane Moscaleski
Revisão: Profa. Dra. Marcela Bermúdez Echeverry
Colaboração: Prof. Dr. Edgard Morya