A neuroarquitetura, a biofilia e o Cohousing, uma das mais avançadas formas de morar e viver com privacidade e comunidade
A neuroarquitetura, a biofilia e o Cohousing, uma das mais avançadas formas de morar e viver com privacidade e comunidade
Uma nova forma de morar e viver começa a ser revelada aos brasileiros. Trata-se
de um modelo que combina a privacidade com que estamos acostumados e que
valorizamos, com aquele perdido senso de comunidade que sentíamos quando
vivíamos nas vilas, onde tínhamos amizade com os vizinhos, que faziam, de certa
forma, parte integrante de nossas vidas diárias.
O adensamento e verticalização das grandes e médias cidades, combinados com a
crescente violência, aceleraram o fenômeno do cocooning, ou do encasulamento,
com o consequente isolamento dos habitantes destas cidades.
Estudos das Blue Zones, as chamadas ilhas da longevidade, regiões com o maior
número de centenários do planeta, têm demonstrado que o fator mais importante
para a longevidade saudável, com qualidade de vida, são os vínculos que criamos
com pessoas próximas, geradores de apoio mútuo e de um senso de pertencimento.
Estamos vivendo mais tempo. Esse tempo extra não fora devidamente antecipado e
menos ainda planejado por nós e nem pela sociedade em que estamos inseridos.
Essa prorrogação da vida traz dentro de si várias implicações. A primeira, dos
impactos sobre a economia e o sistema de saúde desses anos a mais. Com os seus
crescentes custos médicos e sociais. A segunda, com a falta de preparo prévio das
pessoas para como viver esses anos adicionais, os anos da aposentadoria, vem o
aumento de uma sensação de vazio, de falta de um propósito para a vida,
contribuindo para o aumento dos índices de depressão e de uma série de moléstias.
Impactando ainda os familiares e o já sobrecarregado sistema de saúde.
A Dinamarca atentou para esses fatos já nos anos 70. E dos desafios nasceu um
modelo novo de moradia, que contemplava privacidade com comunidade. Visava-
se com isso reduzir os gastos com o suporte às pessoas idosas, ao mesmo tempo em
que se aumentava sua qualidade de vida.
Esse modelo, o Cohousing, prosperou e se espalhou pela Europa do norte, e depois
pelos Estados Unidos. Hoje ele já é presente também no Canadá, na Europa
Ocidental, Austrália, Nova Zelândia, e começa a se reproduzir em vários outros
países.
No Brasil o fenômeno é recente. Grupos de pessoas estão se reunindo em diversas
regiões do país procurando criar o seu cohousing, a sua “vila” de moradia e vida.
O desafio é grande pois as pessoas precisam se juntar, avaliar seus conceitos e
valores de vida em comum, aprender a tomar decisões em grupo, e planejar em
conjunto a sua “vila.
Com tudo isso os primeiros cohousings brasileiros estão começando a tomar forma
e se materializar. O Vila Conviver, em Campinas, cujo núcleo inicial foi formado
por professores aposentados da Unicamp, já tem seu terreno comprado, o projeto
se encontrando em nível avançado, com sua construção prevista para começar em
2023.
A maioria das pessoas que estão buscando essa forma de moradia e vida se
encontra na faixa dos 50 mais. Elas têm um perfil gregário, sendo pessoas que
valorizam as relações comunitárias.
São majoritariamente pessoas solteiras ou casais com filhos já crescidos e
independentes. Valorizam profundamente a autonomia e a realização pessoal nesta
terceira etapa da vida.
O Cohousing é um conceito de moradia profundamente orientado para a vida do
dia a dia de seus membros, para a sua convivência. Para isso, tão importante
quanto as construções, as casas, que vamos chamar de “hardware”, é o “software”,
ou seja, o que acontece em meio a estes edifícios, com a ênfase nos processos de
convivência e cooperação, nas atividades em comum. E é esse “software” que é a
alma do modelo Cohousing.
Estamos na infância desse novo modelo de moradia aqui no país. E não dispomos
ainda de um leque de profissionais com experiencia em cohousing para atender os
nascentes grupos. Precisamos preparar esses profissionais para ajudar a criar,
apoiar e facilitar a criação desses empreendimentos sociais. Arquitetos, advogados,
especialistas em sociocracia, em CNV – comunicação não violenta, mediadores,
facilitadores de grupos, etc... Mas como em todo desafio aqui também se apresenta
uma oportunidade. De inovar com um conceito de moradia que vai de encontro aos
desejos e necessidades das pessoas que irão envelhecer. E ainda de se utilizar dos
mais recentes estudos da neuroarquitetura e da biofilia.
O cohousing e a biofilia têm premissas em comum. Ambos buscam a reconexão. A
biofilia recria as conexões dos seres humanos com a natureza. O cohousing
estimula e promove a reconexão entre as pessoas.
Como comunidade planejada para a qualidade de vida, o projeto do cohousing
deve observar os princípios da relação harmônica com a natureza, com as plantas,
os animais, e valorizar os elementos físicos tais como o ar fresco, a luz natural, o
verde, os sons da natureza e os materiais orgânicos. Árvores e verde devem fazer
parte integrante da paisagem do cohousing de uma forma a estimular a interação e
a conexão físico-espiritual entre morador e ecossistema.
A neuroarquitetura deve ser utilizada para que se projetem espaços que
beneficiem a memória, a melhoria da capacidade cognitiva e a estimulação mental,
evitando, simultaneamente, o estresse.
Tendo em mente que as pessoas tendem a envelhecer no cohousing, as instalações
devem ser planejadas para proporcionar deslocamento a pé confortável, acessível e
seguro, de forma orgânica, modelando-se nas linhas da natureza - curvas,
retorcidas, sinuosas e erráticas. O tato deve ser privilegiado, através da utilização
máxima de materiais com o menor grau de processamento industrial possível, com
suas conformações naturais únicas. São bem vindas as superfícies rugosas,
estimulantes das células sensitivas do tato.
Os pavimentos e estruturas de apoio e contorno devem propiciar a recuperação do
equilíbrio em caso de escorregões e quedas.
Algo normalmente relegado ou esquecido no planejamento arquitetônico
residencial é o sentido olfato. Especial atenção deve-se dar aos aromas. Produtos
sintéticos, que contêm em sua formulação elementos aromáticos, compostos
orgânicos à base de benzeno, aldeídos ou sais de cloro, devem ser evitados. Deve-se
buscar cheiros naturais que nos remetam ao campo, ao bosque, à mata, como os
aromas naturais das flores. A aromaterapia pode e deve ser acoplada ao projeto.
Se o cohousing for rural ele pode e deve incluir um bosque em sua área. Se a área
já contiver o bosque, excelente. Caso não tenha, o arquiteto, paisagista, ecólogo,
deve planejar a criação do bosque, com a plantação de árvores endêmicas, da flora
local, tentando recriar o ecossistema outrora existente na região, com o máximo de
biodiversidade em suas espécies a serem plantadas. Se o bosque já contiver uma
nascente ou um riacho a situação será perfeita. O arquiteto deverá planejar trilhas
dentro do bosque, com locais para relaxamento, meditação, contemplação. Assim o
espaço verde permitirá e estimulará o Banho de Floresta, ou Shinrin Yoku, ciência
nascida no Japão, que descobriu que quando as moléculas dos óleos essenciais
emanadas pelas folhas das árvores penetram em nossos organismos, causam uma
série de benefícios físicos e psíquicos, entre eles o aumento das células NK, as
Natural Killers, uma das primeiras linhas de defesa de nosso sistema imunológico.
E com isso fortalecendo nossas defesas contra uma série de doenças crônicas.
O ecologista social Stephen Kellert considera que apenas a natureza vivida
diretamente causa o pleno desenvolvimento psicossomático para uma consciência
ambiental.
Trazer essa experiência de contato com a natureza para o dia a dia pode se
constituir numa das maiores fontes de bem estar, equilíbrio e completude possíveis.
A experiência da Freeway, acompanhando seus ecoturistas ao longo de quarenta
anos de vivências na natureza, confirma a teoria de Kellert, ao constatar que é
através desta experiência de contato íntimo com a natureza, e do maravilhamento
que esse contato com o belo, com o supremo equilíbrio, propicia, que o ecoturista
desenvolve uma relação de amor e de proteção para com a natureza.
A síntese destes aprendizados aponta para um futuro mais estimulante para os
envelhescentes e a geração dos baby boomers, onde a conjugação vida-moradia-
comunidade-planeta poderá ter um meio e final bem mais felizes.
***
Edgar Werblowsky é um dos incentivadores do cohousing no Brasil. Coordenador do
Curso Internacional de Cohousing (www.cursocohousing.com.br), é criador da Free
Aging, plataforma de eventos para a longevidade (www.freeaging.com.br). Fundador
da Freeway Viagens (www.freeway.tur.br ) e da Immaginare Experiências
(www.immaginare.tur.br), seu contato é edgar@freeway.tur.br
***
https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0272494414000450 -
Transformational practices in cohousing: Enhancing residents' connection to
community and nature – Angela Sanguinetti
http://ojs.bbwpublisher.com/index.php/JARD/article/view/279
Cooperative Housing and Cohousing in Canada: The Pursuit of Happiness in the
Common Courtyards
Donia Zhang
https://periodicos.set.edu.br/cadernohumanas/article/view/9980
NEUROCIÊNCIA COMO MEIO DE REPENSAR A ARQUITETURA : FORMAS DE
CONTRIBUIÇÃO PARA A QUALIDADE DE VIDA
Autores: Larissa Ribeiro Cabral Vieira UNIT e Catharina Castro Cardeal UNIT
https://books.google.com.br/books?hl=pt-
BR&lr=&id=bbstAAAAQBAJ&oi=fnd&pg=PA341&dq=cohousing+neuroscience+bio
philia&ots=NmU_45qW0l&sig=EFgGieft_rombnGtGGQ1d-
vpHCQ#v=onepage&q&f=false
Construction Green
The Social Structures of Sustainability
Rebecca L. Henn and Andrew J. Hoffman
https://www.researchgate.net/profile/Laura-
Malinin/publication/322645431_Enriched_Environments_for_Healthy_Aging_Qualities
_of_Seniors_Housing_Designs_Promoting_Brain_and_Cognitive_Health/links/5a6675
b7a6fdccb61c5a78cd/Enriched-Environments-for-Healthy-Aging-Qualities-of-Seniors-
Housing-Designs-Promoting-Brain-and-Cognitive-Health.pdf
Enriched Environments for Healthy Aging:
Qualities of Seniors Housing Designs
Promoting Brain and Cognitive Health
Agnieszka Z. Burzynska, PhD; Laura H. Malinin, PhD, AIA, EDAC